Discussão sobre qual vidro isola melhor o som é irrelevante. Projeto para atenuação deve reunir recursos sob medida a cada situação.
Qual vidro isola mais o som, o duplo (ou insulado) ou o laminado? Embora a questão seja discutida há bastante tempo o assunto continua atual, já que a poluição sonora tornou-se um problema de saúde pública e tem se agravado a cada dia nas cidades. Diante desta realidade, os vidraceiros não podem se furtar de suas responsabilidades de buscar conhecimento em vez de simplesmente apostarem em uma ou outra solução acústica, muitas vezes dando preferência às mais práticas ou econômicas.
Edison Claro de Moraes, presidente do Conselho da Associação Brasileira para a Qualidade Acústica (ProAcústica), entidade que reúne empresários e profissionais ligados à questão acústica, e proprietário da empresa de soluções acústicas Atenua Som, com base em sua experiência de mercado, acredita que alguns pontos são importantes na hora de escolher o produto. Edison explica: “No caso de optar pelo vidro laminado, a camada de Polivinil Butiral (PVB) que vai entre os vidros deve ter o mínimo de 0,78 mm ou mais de espessura. Caso a escolha seja pelo duplo, há de considerar que, para uma boa performance acústica, ele precisa ter o laminado em sua composição.”.
Ainda sob o ponto de vista acústico, a habilidade de uma janela para evitar o ruído depende dos seguintes fatores: vidros, composição dos vidros, distância entre os vidros, vedações e estrutura (perfis). No que se refere aos vidros, existem disponíveis no mercado o monolítico, o duplo ou o triplo, e é por isso que muitas vezes o profissional vidraceiro acaba se atrapalhando.
Não existe sinergia entre arquitetos, engenheiros e encarregados de obras para se chegar à solução mais adequada. Normalmente esta responsabilidade acaba recaindo sobre o vidraceiro. Moraes tenta esclarecer uma das dúvidas mais comuns. Ele explica: “Se usarmos somente o laminado, primeiro precisamos definir a espessura do PVB, se vamos trabalhar com os míseros e tradicionais 0,34 mm ou o laminado acústico, que pode variar de 0,78 a 3 mm. Muitos ainda consideram como laminado acústico o PVB de 0,34 mm, o que é um grande erro, pois se analisarmos os gráficos de desempenho acústico é possível constatar que existe uma substancial diferença de três a cinco decibéis entre um e outro”.
No setor de acústica muitos defendem que o nome deste tipo de vidro (0,34 mm de PVB) deveria ser “meio laminado”. Portanto, ao escolher usar somente o laminado, é necessário que seja laminado acústico, caso contrário, as comparações com o vidro duplo ficam prejudicadas. É necessário lembrar também que o vidro laminado tem sua performance acústica comprometida nas baixas temperaturas devido ao efeito damping (perda do isolamento). Do mesmo modo, se for utilizado somente o vidro duplo e se sua composição tiver somente vidros monolíticos, o efeito ficará prejudicado.
O ponto mais importante em termos de performance acústica de vidros é a espessura. Quanto mais grosso (pesado) for o vidro, mais isolante ele será, principalmente nas baixas frequências. O vidro laminado é ótimo nas baixas frequências. O vidro duplo, por sua vez, apresenta grandes benefícios no isolamento das altas frequências, destaca Moraes.
Distância entre lâminas
Para Roberto Benet, diretor da Termosom, o vidro insulado com dois vidros monolíticos é mais eficaz para isolamento acústico do que o vidro laminado com a mesma espessura dos vidros e justifica: “Isso se verifica em razão dos dois vidros estarem mais separados no vidro insulado do que no vidro laminado pelo fato de as ondas sonoras, ao ricochetearem no interior da câmara, entre a face dois e três do vidro, perdem força de penetração por se chocarem e se anularem. Essa avaliação, entretanto, pode não se aplicar nos vidros insulados mais comercializados no mercado, que possuem espaçamento entre os vidros de 7 ou 8 mm. Segundo Benet, testes realizados pelo laboratório de ensaios acústicos Institut fur Bauphisik, na Alemanha, demonstram que a distância entre os vidros duplos ideal para a melhor performance acústica é de 12 mm, com uma tolerância de para mais ou menos de três mm, ou seja, mínimo de nove mm e máximo de 15 mm de espaçamento entre vidros.”
O professor com a palavra
Para confirmar essas posições, consultamos o professor doutor em Acústica e Vibrações, Erasmo Felipe Vergara, docente em cursos de graduação e pós graduação da Universidade Federal de Santa Maria (RS), única instituição brasileira a oferecer o curso superior em Engenharia Acústica.
Vergara pontua que o vidro laminado pode apresentar melhor desempenho acústico que o vidro duplo (ou insulado) em algumas situações, mas que deve ser analisado o valor do índice de redução sonora ou perda de transmissão sonora aérea, em função da frequência, para efetivamente se realizar um comparativo por bandas de frequência. Segundo ele, o vidro laminado possui o PVB, que permite aumentar a isolação sonora aérea na freqüência crítica, onde se produz uma queda acentuada da isolação sonora, ou seja, uma diminuição do índice de redução sonora aérea. E exemplifica: “O índice de redução sonora ponderado de um vidro laminado e de um vidro duplo (vidro temperado+ar+ vidro laminado), ambos com o vidro laminado da mesma espessura, podem ser muito próximos, com diferença de um a dois decibéis. Mas a análise comparativa por bandas de frequência pode mostrar que estas diferenças podem ser maiores. O vidro laminado pode apresentar uma maior isolação em baixa frequência, entre 50 e 200hz e para a faixa da acústica de edificações, entre 50 e 5.000 Hz. O vidro duplo apresenta maiores variações no valor da isolação sonora devido às ressonâncias acústica da cavidade e é mais provável que aconteça quedas da isolação sonora em altas frequências, que corresponde de 1.250 a 5.000 Hz.”
De acordo com o acadêmico, apesar de cada um deles ter sua particularidade, tanto para o vidro laminado como para o duplo, as dimensões do vidro, quando utilizado como janela, tem um papel importante porque aparecem efeitos acústicos relacionados com as ressonâncias acústicas do vidro. “Estas ressonâncias podem provocar uma diminuição da isolação sonora aérea, a qual pode ser aumentada mediante o incremento da rigidez do vidro, evitando as vibrações, e consequentemente a radiação sonora”, explica
Quando o assunto é desempenho, a espessura e densidade tem uma participação muito importante para frequências abaixo da frequência crítica, onde ocorre a lei da massa. Nesta faixa de frequência cada vez que se duplica a densidade existe um aumento da isolação sonora aérea de seis decibéis. Também existe um fenômeno associado com a espessura do vidro, já que na medida em que aumenta a espessura do vidro diminui a frequência crítica, isto pode provocar que algumas frequências críticas entrem em alguma faixa de frequência de maior sensibilidade, entre 1.000 e 4.000 Hz do ouvido humano e provoquem maior desconforto acústico.
No vidro duplo a separação entre os vidros através de uma cavidade de ar também tem uma importante participação na isolação sonora. O sistema de vidro duplo se torna muito eficiente quando os dois vidros estão isolados entre si, tanto acústica como mecanicamente. Na cavidade acústica (ar) são produzidas ressonâncias devido ao som incidente em um dos vidros que provocam a diminuição da isolação sonora aérea.
O professor compartilha da mesma opinião de alguns profissionais do mercado que afirmam que a eficácia de um projeto acústico não está apenas no vidro que se utiliza, mas no conjunto da obra. “A participação das esquadrias na isolação sonora aérea de vidros é essencial, já que deve evitar a transmissão acústica e vibratória. Ou seja, o componente deve contribuir no amortecimento de vibrações e evitar a transmissão sonora através de vazamentos e aberturas. A estanqueidade da janela também é importante em termos da rigidez mecânica que evite muita vibração e o tipo de fechamento usado (de correr ou de giro) que evitem folgas para evitar que a isolação sonora aérea diminua”, finaliza
Outro fatores que podem ainda influenciar no projeto acústico de janelas de vidro para a isolação sonora aérea do ruído são: qualidade dos materiais, mão de obra de fabricação e instalação de janelas de vidros, atender as especificações em termos de dimensões, densidade, espessuras e fechamentos.
Um mais o outro
Edison Moraes diz ter a melhor solução para minimizar os efeitos dos ruídos: “A composição vidro duplo + vidro laminado é considerada ideal, pois funciona nas baixas e altas frequências, além dos fatores térmicos, que merecem um capítulo à parte.” Resta saber se o especificador ou construtor estará disposto a pagar o custo elevado dessa solução sofisticada.
O empresário ressalta ainda que os vidros sempre acompanham uma estrutura (perfis), portanto, qualquer análise em separado pode ser equivocada.
O empresário lembra que os perfis não podem ser esquecidos em todos os projetos de atenuação acústica, pois se eles não forem compatíveis com os vidros utilizados em termos de performance será “como colocar um motor de Ferrari em um Fusca”, descreve. “Aliás, este é um erro muito comum, especifica-se o vidro e não o caixilho ensaia-se o vidro e não o conjunto” finaliza o engenheiro.
PVB Acústico
De acordo com a gerente mundial de aplicações da Solutia, Julia Schimmelpenningh, três critérios básicos são usados em projetos de vidros acústicos: rigidez do vidro, isolamento do espaço aéreo e amortecimento.
A multinacional tem em seu portfólio um PVB Acústico que introduz a tecnologia Silent Glass no vidro laminado. No mercado desde 2009, a película apresenta um filme com três camadas responsáveis pela atenuação sonora.
O sistema possui uma camada intermediária avançada que transforma energia sonora em energia térmica, que então facilmente se dissipa. Além disso, Silent Glass atua com sons entre 1000-3000 hz, faixa que é o “ruído de transparência”, intervalo que permite o bloqueio de sons irritantes, como buzinas de carros, cães latindo, amplificadores, música e aeronaves.
A utilização da tecnologia em janelas pode resultar em uma redução de até 10 decibéis, frequência que equivale em uma redução de 50% do som percebido.
Já a concorrente DuPont não tem um interlayer desenvolvido exclusivamente para minimizar os impactos sonoros. No entanto, a empresa informou que um vidro laminado com Butacite oferece uma boa barreira sonora. O produto é um termoplástico rígido e resiliente utilizado como interlayer em vidros de segurança laminados para aplicações tanto em estruturas arquitetônicas quanto em vidros para automóveis. Entre as aplicações, está a utilização em pára-brisas e componentes de construção. A reportagem de Tecnologia & Vidro entrou em contato com a empresa a fim de entrevistar algum técnico sobre a capacidade de atenuação do som, porém fomos informados de que não havia ninguém disponível para atender a equipe.
Normatização do vidro duplo
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) disponibiliza para consulta nacional até o dia 28 de novembro a norma técnica “Vidro Insulado: características, requisitos e métodos de ensaio”. Um dos itens que promete gerar polêmica no setor é a mudança na denominação do vidro duplo para insulado. A discussão poderá ocorrer porque o nome “Insulado” já foi registrado no Brasil como marca de um fabricante.
As discussões foram iniciadas por uma comissão de estudos formada por transformadores de vidros e técnicos da ABNT. Representantes do setor poderão analisar o projeto na íntegra, que tem 56 páginas, e enviar críticas e sugestões até o prazo previsto. Caso elas sejam pertinentes, o projeto poderá sofrer uma revisão antes de entrar em vigor. De acordo com o gerente técnico da Abravidro, Sílvio Ricardo Bueno de Carvalho, vários países já utilizam a denominação vidro insulado e a padronização se faz necessária para atender as necessidades do mercado global. A mudança irá definir os parâmetros para avaliação da qualidade e desempenho do vidro duplo. O projeto 37:000. 03-005 está disponível para consulta no endereço www.abntonline.com.br/consultanacional