Formação profissional insuficiente, falta de interesse e de incentivos são alguns dos entraves do mercado de trabalho vidreiro
“Temos vagas, mas faltam profissionais qualificados”. Esta é hoje é uma das frases mais comentadas pelos empresários do setor vidreiro e também um drama que afeta duas classes produtivas. De um lado estão os jovens que buscam o primeiro emprego para complementar a renda de suas famílias ou conquistarem a tão sonhada independência financeira. Do outro lado estão os empregadores, que apesar de se debruçarem diariamente em uma pilha de currículos não encontram pessoas capacitadas para desempenharem determinadas funções dentro das corporações.
Trata-se de um problema crônico que só será resolvido com uma solução que parece óbvia: investir em educação, especialmente no ensino técnico profissionalizante.
Uma recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) confirma essa triste realidade e mostra que apenas 51% das pessoas que buscam o primeiro emprego são qualificadas. De acordo com a fundação, vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e que tem como missão oferecer suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação de políticas públicas, o Brasil deve gerar 1,7 milhão de novos empregos este ano, mas apenas 1,2 milhão das vagas serão preenchidas. Os dados revelam uma contradição, já que vivemos um ótimo momento de ofertas de produtos e de emprego também. O que aparece nas vitrines já está nas planilhas dos economistas, o que leva a crer que falta visão de futuro.
Depois de receber vários pedidos de indicações de cursos pelos internautas que acessam a versão digital da revista Tecnologia & Vidro, disponível em www.vidro.inf.br, a reportagem foi a campo e descobriu que investir na qualificação e capacitação profissional não é só uma responsabilidade dos governos. A reportagem fez um mapeamento das escolas e entidades que oferecem cursos técnicos para vidraceiros, de norte a sul do país, e tentou mensurar os resultados que vem sendo obtidos por meio desses programas. No meio do trajeto encontrou também iniciativas muito válidas de gente disposta a contribuir para o desenvolvimento profissional dos trabalhadores.
Especialmente no setor vidreiro, os empresários precisam ainda contornar a escassez de trabalhadores que foram seduzidos por uma máquina bastante poderosa: o computador. Com o avanço da tecnologia, os jovens estão cada vez menos dispostos a operar ferramentas e carregar peso. Segundo o relato de alguns vidraceiros, muitos jovens preferem o conforto do escritório à linha de produção, mesmo desprezando salários atrativos. Em contrapartida, as mulheres conquistam espaço em um mercado potencialmente masculino, como é possível acompanhar nesta edição e na edição passada da seção Vidraceiro em Foco.
Bons salários
Durante uma busca realizada nos dois principais sites de recrutamento e seleção do Brasil, em apenas um dia encontramos dezenas de vagas abertas para vidraceiros e similares.
Em São Paulo, capital, a média salarial de um vidraceiro é de R$ 1.800,00 (para empresas com mais de 12 funcionários), mas estes valores podem variar em outras regiões do país. As entidades do setor patronal possuem tabelas próprias, mas não as divulgam. Já segundo o Sindicato dos Vidreiros de SP, os trabalhadores da categoria não podem receber salários inferiores ao piso, que é de R$ 826,54.
Tolentino Soares de Souza, instrutor/orientador do Senai-SP afirma que os trabalhadores de chão de fábrica sentem-se desvalorizados, embora o índice de empregabilidade chegue a 80% após os alunos concluírem o programa. “Os vidraceiros se queixam que faltam programas de incentivo, planos de carreira e oportunidades de crescimento nas empresas”, desabafa. A carência de cursos nas regiões norte e nordeste acaba atraindo também alunos para São Paulo, que depois de formados tentam se estabelecer no próprio estado.
Cursos em São Paulo
Pioneiro no Programa de Formação Continuada Qualificada, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de São Paulo, em parceria com a Associação Brasileira dos Distribuidores e Processadores de Vidro Plano (Abravidro), mantém o Curso de Vidraceiro desde 2004.
A carga horária é de 160 horas, com aulas de segunda a sexta-feira no período noturno ou aos sábados o dia todo. Para obter o certificado os alunos precisam ter um aproveitamento de mais 50% nas aulas teóricas e práticas, mais freqüência de 75%.
O valor total é de R$ 600,00 e o pagamento pode ser dividido em três parcelas iguais. Na grade curricular estão incluídas disciplinas como a história do surgimento do vidro, noções do processo fabril do vidro comum, têmpera, laminação, espelhação, corte, lapidação, furo, medição, colocação do vidro comum, medição, desenho, folgas e colocação do vidro temperado.
As turmas são formadas por até 12 alunos para facilitar o aprendizado. Até hoje aproximadamente 400 pessoas já passaram pelo curso. A coordenação não faz o encaminhamento dos recém formados para as empresas, porém disponibiliza as vagas abertas por empresas em um mural para que eles possam se inscrever nos processos seletivos.
Se depender do vidraceiro Osvaldo Valente Junior, ex-aluno do curso do Senai, a profissão nunca irá acabar. Ele faz parte da terceira geração de uma família de vidraceiros. Junior concluiu o curso em 2008 e contou com uma motivação a mais para freqüentar as aulas: a noiva, que já era formada em Administração e resolveu fazer o curso também. Hoje os dois trabalham juntos na Murano Vidros. O rapaz atribui nota 9,5 para o curso e só acha que faltou um pouquinho mais de prática de colocação de janelas.
José Edmundo Raimundo terminou o curso em março e está em busca de uma oportunidade na área de instalação. Atualmente ele trabalha como vendedor de peças em uma concessionária de veículos. Nos finais de semana realiza uns bicos como vidraceiro e está confiante que vai conseguir em breve um emprego com boa remuneração.
Outra opção em São Paulo com cursos de aprendizagem, aperfeiçoamento e reciclagem é a Escola do Vidraceiro, em funcionamento desde 2001. De acordo com a coordenação, até agora 10 mil pessoas passaram por ela.
O curso mais completo é o Técnico de Vidraceiro, que é totalmente gratuito graças ao patrocínio de empresas. Com uma carga horária de 76 horas/aula, a programação inclui: características, beneficiamento e correta especificação dos vidros em geral; Elaboração e apresentação de orçamento, medição, projeto, folgas, desenho de planta baixa, elevação, elaboração do projeto para fabricação dos vidros; Instalação e regulagem de molas, ferragens e perfis, incluindo conjunto de correr; Instalação de Box de correr e abrir; corte, noções de lapidação, instalação de vidros comuns.
Existem ainda os seguintes cursos pagos, com valores que variam de R$ 350,00 a R$ 550,00:
– Técnico de Vidro Temperado (24horas/aula)- características do produto,especificações, medição, projeto, molas, instalação de Box, noções de instalação em engenharia, espelho e orçamento.
– Envidraçamento de Sacada (24 horas/ aula)- medição técnica, desenvolvimento do projeto e orçamento, preparação das peças, especificações técnicas do sistema, aspectos jurídicos da utilização em fachadas
-Serralheria Básica (16 horas/ aula) alumínio na construção civil, janelas, caixilhos, esquadrias, dimensionamento de vãos, mercado, produtos, linhas fechadas e prática de montagem de esquadria.
– Pele de Vidro (16 horas/ aula) fachada cortina, fachada glazing, desenhos, procedimentos de colagem, conceitos de utilização do vidro.
– Spider e Guarda-corpo (16 horas/ aula) conceito, características mecânicas, medição técnica, aplicação, tipos de spider, produtos de guarda-corpo.
– Portas Automáticas (16 horas/ aula) análise do local a ser instalada, verificação do sistema elétrico, dimensionamento das portas, vidros, fixação dos equipamentos e montagem do movimentador, ligação e programação do sistema eletrônico.